Impôs-se,
à minha consciência, depois de refletir sobre a manifestação do dia 23 de março
e sobre os discursos dos líderes sindicais, os seguintes problemas: como surgiu
a representatividade ou os sindicatos enquanto representatividade? O que os fez
entrar em crise? Ao que procurei dar uma resposta nos seguintes termos.
O
homem é por natureza um ser de desejo. Ele interfere em seu ambiente buscando
satisfazer seus objetivos mais imediatos. Ao perceber que o seu interesse – quando
os objetos de desejos são postos publicamente – é também o interesse de seu
semelhante, une-se a ele visando alcança-lo mais facilmente: o objeto comum de desejo torna-se então causa de
unidade. E assim surgem os grupos, as comunidades e as classes. Note-se que o
cimento social que congregam os homens é “aquilo que é comum” a eles.
Com
o passar do tempo, o crescimento populacional e a consequente complexidade das
relações sociais – sobretudo os interesses difusos das inúmeras classes – surge
também a necessidades de governo e de leis; e assim, surge, inclusive como
principio de economia (dada à impossibilidade de dialogar com uma classe muito
extensa) a representatividade, isto é, a criação de uma pessoa com amparo legal
para representa-las em um possível conflito de interesses entre grupos ou entre
grupos e governo. Dessa forma, representatividade significa, neste contexto,
fazer conhecido o objeto de interesse de uma classe a outra ou a um gestor
através de uma pessoa jurídica que a represente enquanto classe. Dessa forma, a
natureza dessa pessoa jurídica, doravante sindicato, é representar a vontade de
outro – a coletividade; e para saber ou conhecer essa vontade se requer a escuta
atenta, noção incluída já no próprio conceito de representatividade; se requer
uma declinação para se poder apreender a vontade da coletividade e
transforma-la em discurso: o logos sindical é assim a voz da coletividade
organizada já que expressa suas vontades. Portanto, o discurso sindical nasce
no interior mesmo da classe.
Então,
quando o discurso é construído à parte de sua classe, ele nasce como algo que
lhe é alheio: a classe não se reconhece mais no discurso da representatividade.
É algo que lhe vem de fora; imposto e que se lhe contrapõe. Não há neste
contexto mais representatividade. Nesse sentido, o objeto do discurso passa a
ser o produto da vontade daquele que ganhou autonomia em relação a sua classe.
É discurso que serve agora de cimento, unindo os indivíduos alienados de suas
vontades comuns em prol de um estranho, o sindicato, que os usa como massa de
manobra ignorante para mostrar a outros a sua força de agregação, fazendo-os se
dobrarem aos seus interesses egoísticos.
Cabe,
assim, aos representados, relacionar outra vez a ligação natural entre o
pensamento da classe e sua expressão verbal, que é o discurso. Mas, diante da
crise da representatividade, como pode isso ser possível? Como é possível a
religação entre discurso sindical e vontade coletiva?
Autor:
GM Hugo de Albuquerque
Teólogo
e pós-graduado em Ciências
da
Religião.
Um comentário:
A farda modela o corpo e atrofia a mente
Che Guevara
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