Com anseio dos eleitores por redução nos índices de violência, a pauta de segurança pública se tornou um palco de disputa entre o governo e oposição e já resvala também nas eleições municipais. Esse embate deve se acirrar à medida que o Congresso deve priorizar o tema no segundo semestre. A principal aposta do Planalto para deixar uma marca nesse segmento, afastando as críticas dos adversários políticos, é um projeto desenhado pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski. Enquanto é vista com bons olhos no Senado, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança enfrenta resistências na Câmara, entre governadores e até artilharia dentro da própria gestão petista.
No Senado, há a avaliação que a proposta do governo
tende a ser bem recebida, já que os parlamentares vem se dedicando ao tema. Só
na primeira semana do mês, quatro iniciativas relacionadas à segurança
avançaram no Congresso.
O diagnóstico de que o Congresso dará
prosseguimento à PEC é compartilhado por integrantes da cúpula da Mesa e da
oposição do Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já teve uma
primeira conversa sobre o projeto com Lewandowski, e planeja promover uma
reunião entre o ministro e lideranças do Senado nas próximas semanas.
— Parece-me uma ideia boa. Obviamente, ela precisa
ser construída juntamente ao Parlamento para ter viabilidade. Então, vamos
promover esse encontro em breve para que o ministro possa expor as ideias dessa
constitucionalização do Sistema Único de Segurança Pública. Assim, iniciamos
agosto eventualmente com essa discussão — disse Pacheco ao GLOBO.
Além de ter boa relação com Lewandowski, Pacheco
tem demonstrado interesse em debates que resvalem no tema da segurança.
— Se depender de mim, o projeto avança — afirmou
Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro de Jair Bolsonaro e presidente do PP.
Ex-ministra da Agricultura do governo Bolsonaro e
integrante do bloco de oposição no Senado, Tereza Cristina (PP-MS) diz que o
tema abordado pela PEC "transcende" a disputa ideológica e, por isso,
a proposta tende a avançar na Casa.
— É importantíssima essa pauta. As pessoas se
sentem inseguras, vemos várias facções tomando conta de vários setores. Temos
de estudar qual é o novo modelo precisamos adotar para a segurança pública no
Brasil. Esse assunto tem de ser colocado na mesa — disse a senadora.
O Ministério da Justiça formulou a PEC com o
objetivo de robustecer a atuação da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária
Federal no combate ao crime organizado. O texto foi enviado à Casa Civil e
aguarda pela deliberação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na Câmara, parlamentares ligados ao bolsonarismo
indicam que estarão prontos para barrar a iniciativa se houver discordâncias. O
rito constitucional demanda que uma PEC de iniciativa do Executivo comece a
tramitar pela Câmara. Mas, caso seja de interesse do governo, é possível reunir
a assinatura de 27 senadores para que o texto inicie o processo legislativo no
Senado.
— O que ouvi até agora é que essa PEC não vem somar
em absolutamente nada. A bancada da Segurança Pública, com seus 292 deputados,
vai se inteirar dos fatos e fazer a pressão que deve ser feita — diz o
presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, deputado Alberto Fraga
(PL-DF).
Iniciativas avançam
Ao
acelerar a análise de projetos sobre o assunto, a Comissão de Segurança Pública
do Senado aprovou dois textos no início do mês: um que prevê prisão especial
para profissionais de segurança pública e outro que aumenta a pena de crimes
cometidos durante as "saidinhas".
—
Existe uma cobrança muito grande da população pedindo socorro por conta da
segurança. É preciso fazer correções na legislação — disse o senador Sérgio
Petecão (PSD-AC), presidente da Comissão de
Segurança Pública do Senado
Por
sua vez, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou uma
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que inclui as guardas municipais no rol de profissionais de segurança pública, o
que abre margem para que esses profissionais estejam armados, medida que é
defendida por diversos pré-candidatos a prefeito, inclusive da esquerda.
A
CCJ da Câmara também aprovou um projeto que permite a realização de audiências
de custódia por videoconferência. Em entrevista ao GLOBO, o presidente da Casa,
Arthur Lira (PP-AL), elegeu a segurança pública como prioridade para o segundo
semestre.
— O Brasil precisa olhar para o combate às facções, ao tráfico de armas,
de drogas, monitoramento mais específico das forças policiais — disse Lira.
Preocupação na Casa Civil
A PEC
gestada pelo Ministério da Justiça não foi pacificada no governo. Integrantes
da Casa Civil avaliam que o texto empodera demais Polícia Federal e a Polícia
Rodoviária Federal e, por consequência, membros dessas corporações
identificados com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Interlocutores
de Rui Costa lembram que o próprio PT já se manifestou contra ações da PF na
época da Lava-Jato — o ministro e Andrei Rodrigues têm relação distante. Outra
avaliação é que a equipe de Lewandowski não está fazendo uma avaliação política
de 'riscos' da PEC, como o de modificações expressivas por emendas da oposição.
Há
também o temor de trazer para o governo um tema que é de responsabilidade dos
estados. Assim, o grupo próximo a Rui Costa defende a participação no assunto
de uma forma mais indireta, como, por exemplo, regras flexíveis para acesso dos
estados às verbas dos fundos Penitenciário e de Segurança Pública, que têm
recursos represados.
O
tom de cautela também é adotado pela maior parte dos governadores, já que os
detalhes da proposta ainda não foram divulgados.
— Tendo em vista a responsabilidade que os governos
estaduais têm sobre o tema, espero que os governadores sejam chamados antes de
qualquer movimentação — diz o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite
(PSDB).
A posição é endossada por Renato Casagrande (PSB),
do Espírito Santo, que elogia a oportunidade de debate:
— Gosto da ideia de haver uma proposta e o debate
tem meu total apoio. Mas espero que o ministro nos convide para conversar antes
da PEC começar de fato a tramitar.
O receio de alguns governadores é que o governo
federal acabe aumentando seus poderes e interferindo de alguma forma nas
polícias estaduais.
—
Essa é uma pauta universal, um tema de todos, é algo que vai além de governos —
diz o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD). — O que não pode é o governo
federal querer tirar autonomia dos estados.
Numa
tentativa de ampliar a aceitação, Lula disse que vai elaborar o texto com os
governadores de todos os estados, sem ficar preso às ideias gestadas
exclusivamente no Palácio do Planalto ou no Ministério da Justiça.
Propostas
em tramitação na Câmara
- Criação da Sala Lilás nas delegacias, especializada em atender mulheres — aprovado na Comissão de Finanças da Câmara.
- Prioridade para agentes de segurança no Desenrola — aprovado na Comissão de Segurança da Câmara.
- Regulamentação de convênios entre guardas municipais e polícias — aprovado na Comissão de Segurança da Câmara.
- PEC das Drogas — aprovada no Senado e pela CCJ da Câmara.
- Criação de cadastro para facções criminosas — aprovado na comissão de Segurança Pública da Câmara.
- Aumento da pena para crimes contra profissionais de segurança — está em análise pela Comissão de Segurança Pública da Câmara.
- Regulamentação das audiências de custódia online — aprovado pela CCJ da Câmara.
- Endurecimento da liberação após audiências de custódia — em análise pela CCJ do Senado.
- Prisão especial para agentes de segurança — aprovado na Comissão de Segurança Pública do Senado.
- Aumento da pena para furto de cabos de energia — em análise pela CCJ do Senado.
- PEC que prevê guardas civis no rol de forças da segurança pública — aprovado pela CCJ do Senado.
- Aumento a pena de crimes cometidos durante as "saidinhas" — aprovado na Comissão de Segurança do Senado.
- Proibição para transferência de presos de alta periculosidade para a penitenciária federal de segurança máxima localizada em Brasília — em análise pela Comissão de Segurança Pública do Senado.
- Restrição à progressão de regime de cumprimento da pena nos casos em que o preso tenha sido condenado por crime praticado com emprego de violência contra crianças — em análise pela Comissão de Segurança Pública do Senado.
- Medidas protetivas em caso de violência contra menor — em análise pela Comissão de Segurança Pública do Senado.
- Projeto que dificulta "saidinhas" — aprovado pelo Senado, Câmara e derrubada do veto no Congresso. Fonte: O Globo
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